Linhas de Pesquisa

Retoricidade: a linguagem como fato social

As reflexões a respeito das relações entre História e Retórica retornaram às mesas de trabalho dos intelectuais com o chamado lingustic turn a partir dos anos 1970. Se a ideia de que o texto historiográfico corresponderia mais a um estilo de escrita do que ao produto de uma disciplina científica (como indicara H. White) encontrou inicialmente forte resistência entre os historiadores de ofício, os mesmos passaram recentemente a aceitar a retórica não somente como elemento constitutivo de sua escrita, mas principalmente, como aspecto metodológico fundamental na produção do conhecimento histórico (C. Ginzburg). Confirmando o lugar central ocupado pelos documentos no trabalho do historiador, os pesquisadores atentos às relações imbricadas entre a “retoricidade” da linguagem e a organização das sociedades começaram a revalorizar os estudos hermenêuticos buscando compreender o contexto sociocultural da produção material e intelectual dos textos. É nesse sentido que devemos entender a vasta produção historiográfica dos anos 1980 e 1990 centrada no estudo das representações e dos discursos. Mais recentemente novas linhas de pesquisa (como por exemplo a “história semântica” de A. Guerreau ou a “nova filologia” de B. Cerquiglini) vêm demonstrando, por caminhos diferentes, a importância e a riqueza do estudo detalhado dos múltiplos aspectos que compõem a produção dos texto.

Dentro desta Linha de Pesquisa, o núcleo carioca do LATHIMM, sediado no Instituto de História da Universidade Federal do Rio de Janeiro, tem dois eixos temáticos centrais: ETC_1) Práticas Escritas na Idade Média e ETC_2) Medievalizando: História medieval e contemporaneidade.  Tais eixos se desdobram em Grupos de Estudo (GE) nos quais se desenvolvem pesquisas sobre os mais diferentes objetos. Dentre os GE destacam-se por sua perenidade e pelas produções já realizada: ETC_1) GE História Social da Igreja Medieval e GE Emoções e Sensibilidades na Idade Média; ETC_2) GE A Historiografia Medievalística e o Medievalesco.

 

A imagem medieval: ornamento, materialidade, permanências

Nos últimos anos, a disponibilização na rede mundial de computadores de publicações digitais e de sites com repertórios de imagens vem viabilizando cada vez mais a realização de pesquisas sobre arte medieval fora do espaço geográfico europeu. É nesse sentido que propomos a presente linha, que agrega pesquisas coletivas e individuais sobre as imagens medievais, considerando-as sob vários ângulos e em uma perspectiva sincrônica e diacrônica. Assim, ao mesmo tempo em que são pensadas as imagens em seu contexto medieval de produção e consumo, também são estudadas suas permanências, apropriações e manipulações nos períodos posteriores. As pesquisas tratam dos aspectos mais variados das imagens, como sua materialidade, as relações com o espaço, a ornamentação etc.

 

 

A música medieval: análise, liturgias, notações

A linha de pesquisa de música medieval do LATHIMM volta-se ao estudo dos manuscritos musicais medievais em toda a sua amplitude, especialmente com particular destaque para os manuscritos litúrgicos dotados de signos musicais no período que se estende entre os séculos IX e XII. Esses sistemas de escrita da música são compreendidos em suas complexas interações com os outros elementos dos manuscritos (iluminuras, texto, aspectos codicológicos), bem como com suas situações de confecção e uso, aproximando-nos, assim, da compreensão do manuscrito medieval como uma espécie de “objeto total”. Também se inserem no escopo dessa linha de pesquisa os diversos aspectos da recepção desses manuscritos e dessas notações, em uma complexa história que é, em parte, a do desenvolvimento da paleografia e da musicologia modernas.

 

 

Códices medievais e renascentistas e a produção científica do conhecimento sobre a natureza

Dentre as várias possibilidades de problemáticas que o estudos dos códices podem levantar, esta linha privilegiará aqueles voltados à investigação da produção de conhecimento científico sobre a natureza. Em particular, aquele conhecimento construído na intersecção de conteúdos oriundos de campos do saber como a medicina, a botânica, a agronomia e a astrologia, cujo racionalismo moderno compartimentou em lugares científicos distintos, mas que na Idade Média e no Renascimento pertenciam a um conjunto único e dinâmico de conhecimentos, muitas vezes associados à Physica ou à Filosofia Natural.

A linha assenta-se, portanto, em três premissas principais. A primeira diz respeito à importância da existência material dos objetos como dimensão que permite alargar a compreensão de diferentes realidades históricas. A segunda assume que existe uma ciência medieval de configuração própria e, portanto, desvinculada do paradigma racionalista que pauta a ciência moderna. A terceira, finalmente, reconhece e valoriza o tempo longo como fluxo no qual se deve sempre pontuar as conjunturas mais específicas que envolvem os objetos de pesquisa.

Dessa forma, para além do diálogo que obviamente deve ser estabelecido com a historiografia da Idade Média, são bem-vindas igualmente as interfaces com a paleografia, a codicologia, a história da arte e, com destaque, com a nova história da ciência (em particular à história da medicina) que vem sendo produzida nos últimos vinte anos. Os seguintes eixos temáticos serão privilegiados: 1) Transmissão do conhecimento clássico sobre a natureza através da Idade Média e do Renascimento e seus possíveis diálogos, trocas e apropriações; 2) Medicina e alimentação nos manuscritos medievais e renascentistas sobre a natureza; 3) Humanismo renascentista e medievalidade na classificação de saberes sobre a natureza.